domingo, 16 de setembro de 2012


Porque o Professor do cursinho havia pedido uma redação sobre quem nós éramos. Eu escrevi, a Érika revisou lindamente. E depois o Professor acabou lendo em voz alta pra sala toda, comentando que estava boa. Foi bom ouvir um 'SENSACIONAL!' gritado por uma guria quando ele finalizou. <3
Pena que quem eu queria que ouvisse não estava lá. =/


sábado, 18 de agosto de 2012

Recomeçar.


Finalmente! As aulas do cursinho começaram. Eu teria inúmeras coisas a dizer sobre tudo o que está acontecendo. Como estou cansado, como ando com sono, como ando com fome. E claro, como me sinto desesperado, em saber que é tão pouco tempo pra se ver tanta coisa. Em como a gente está atrasado, quando paramos para comparar com outras pessoas que estão há anos se preparando pra essa prova de vestibular. Eu pensei em falar sobre as aulas, como é bom rever alguns conceitos. Queria falar sobre o que de fato estou vendo no cursinho, a matéria, aquilo que eu vou ter que entender e gravar para usar na minha prova. Mas a primeira percepção que eu tive do cursinho vai um pouco além disso.
Eu nunca fiz cursinho. No colégio, havia uma ‘turma de cursinho’ de finais de semana, mas era com os mesmos professores das aulas normais, parecia sempre ser sempre, só mais do mesmo, sabe? Não fazia sentido e não me preenchia.

Tem o fato também de estar fazendo um cursinho popular. Querendo ou não, o discurso de quem está lá na frente é um pouco diferente. Meus professores parecem ser aquele tipo  de jovem militante, que você vê em notícias ou então conhece na beira de um bar, tendo um papo filosófico enquanto toma uma cerveja e depois não vê nunca mais na vida.

Como um deles citou durante alguma aula, o cursinho é mais do que passar no vestibular. A intenção deles é, de verdade, fazer com que as pessoas pensem diferente e sejam críticos com absolutamente tudo. A não aceitar as coisas, a não ser pacifista. A exigir porquês, a questionar notícias, questionar situações e questionar, inclusive, a nós mesmos: que porra louca toda é essa que está acontecendo.
Acho que de toda minha vida, essa foi uma das semanas mais reflexivas que tive. E com assuntos que até então eu sequer me preocupava. Provavelmente é a nostalgia, desses momentos de caderno, lápis, caneta e lousa. Com a diferença entre o professor de colégio, tão distante e o professor de cursinho, tão próximo.

Não só fisicamente, ta?

Ouvi dizer essa semana que eu estava visivelmente um bagaço, cansado e com sono. Mas que o brilho no meu olho já estava diferente, que eu estava mais feliz e mais motivado. E estou mesmo. Eu me sinto exatamente assim. Não sei que lavagem cerebral é essa. Não sei de onde essa motivação contagiante de mudar de vida e de mudar o mundo está vindo. Mas tá funcionando!

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Textos que nunca terminei #2

Daniel

Gemidos baixinhos enquanto Daniel se masturbava, assistindo uma garota maravilhosa pela internet. Sua mente corria por todo o corpo moreno, queimado de sol, de Carolina. E só parou quando ela avisou que já estava de saída. Ele apenas fechou os olhos e deixou que a imaginação terminasse o trabalho. Nu na cadeira, jogou a cabeça para trás e gozou sobre sua barriga muito bem definida.
Ainda respirando forte e ritmado, procurou algo a sua volta. Encontrou uma garrafinha de Amarula vazia, que havia ganhado de Pedro, seu colega de quarto, junto com mais três garrafinhas. Miniaturas de cachaça, tequila e vodka. Uma delícia.
Coletou delicadamente tudo o que havia liberado e apertou forte a garrafinha. Ainda sujo, levantou-se, foi até o banheiro que havia dentro do quarto, pegou um pedaço de papel e limpou-se. Foi até a janela e acendeu um cigarro, fumou olhando a praia. Sua praia, como ele gostava de imaginar. Cada pedacinho daquela orla era dele, por direito adquirido.
Gostava do mar, gostava do cheiro do mar. Lembrava de sua infância e de quando ia com sua família navegar. Seus pais sempre foram muito bem afortunados e o iate da família não parava um final de semana sequer na marina. Ele tinha uma Polaroid e tirava fotos de todos os momentos. Dos peixes que seu pai pescava, de sua mãe com a bóia em alto mar, de seu irmão menor, dos detalhes do barco, do céu, das nuvens. Do que surgisse.
Hoje, aquelas e tantas outras fotografias estavam em caixas, muito bem guardadas. A mãe de Daniel descobriu logo a beleza do filho era única e de futuro fotógrafo, passou a ser o fotografado. Books e mais books feitos à custa de seus pais. Desfilou inúmeras vezes. A família era bem relacionada e convites não faltavam. ‘Menos televisão’, dizia sua mãe, ‘Meu filho é pra ser admirado, não vendido’. Era um conceito louco que ela tinha. Não adiantava discutir. Moda era arte o resto era feira.
Apagou o cigarro num cinzeiro que ficava numa cômoda próxima à janela e foi novamente ao banheiro. Ligou o chuveiro. Água gelada. Entrou delicadamente, deixando cada filete d’água tocar seu corpo trabalhado. Passou a mão pelo peitoral, se ensaboou com sabonete líquido e uma esponja macia. Lavou seus cabelos castanho-claros, queimados naturalmente do sol nas pontas. Desligou a água após um tempo e bagunçou os cabelos, molhando tudo a sua volta.
A água respingou no espelho acima da pia, pelo chão, pelo vaso e pelo outro garoto que o estava seguindo o tempo todo pelo quarto, com sua filmadora à mão.
‘E corta’
Daniel sorriu e pegou a toalha branca, que estava pendurada ali perto. Sorriu e fez um cafuné, bagunçando um pouco mais os cachinhos de Yuri, seu colega de quarto, que estava quase deitado no chão do banheiro, buscando um ângulo diferente do comum.
Saindo pela porta do banheiro, ainda enxugando o cabelo, pegou uma sunga qualquer da sua primeira gaveta, uma camiseta preta e uma bermuda xadrez. Ajeitou o cabelo rápido, sem se olhar e saiu.
- A Carol ta chegando, vou comprar um cigarro e encontro vocês no Tranquêra.
-Ok.

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Louco.


 
É o que eu mais tenho ouvido nesses últimos dias. Que sou louco, que faço as coisas no impulso, que não to pensando nas consequências, que quero vida-boa, que eu vou me arrepender...
Conversei com meu chefe, me coloquei à disposição o tempo que for necessário (ainda este ano) na empresa, pra deixar tudo redondinho, mas que ó, um beijo aê, não agüento mais e PRECISO sair desse(s) emprego(s).
Vai fazer um mês mais ou menos que eu comuniquei. Fui honesto com ele e comigo, eu acho. Me orgulho disso. Tenho pra mim que ele ainda não aceitou a ideia, ou melhor, que ele ainda não ACREDITA na ideia que eu esteja mesmo indo embora daqui. Comoção geral, todo mundo me fazendo chorar quando pode, sabe? Até gente que eu nunca tive muita proximidade veio ‘admirar’ meus atos, mas pedindo para que eu reconsiderasse.
Mal sabem que nada disso é sem pensar. Há praticamente um ano atrás eu já tinha cantado essa história.
Faltou coragem.
Mas agora ela veio. Não sei como vai ser, não sei o que vai dar certo, o que vai dar errado. Talvez voe merda para todos os lados, mas quer saber? Que voe. Diz a Omo que se sujar faz bem. Eu quero poucas coisas nessa vida. Quero um amor, um cantinho e um salário que dê pra pagar meu cigarro e minhas pingas de vez em quando. Não parece tão complicado, mas é. (será?)
Com esse meu emprego, o meu cantinho idealizado ficaria longe demais, o amor eu parei de acreditar (mentira) e o salário, sinceramente, eu não achei que estava compensando. Lembro na faculdade, em alguma aula perdida de comportamento, a professora explicando que salário não era fator motivacional, porque não era permanente, ele podia dar uma MASCARADA na situação, mas que logo a melancolia da situação iria voltar. Comentava ao mesmo tempo com meus amigos: fofo, me pagando bem eu aguento qualquer coisa (ui!). Oh, língua maldita. Paguei, obviamente. Hoje sei que salário não motiva porra nenhuma. Porque existe um pequeno segredo nessa vida que é: saber sua realidade. Quando eu ganhava um terço do que ganho hoje, juro que fazia MUITO mais coisas do que faço agora. Sobe receita, sobe despesa. Não precisa ser formado pra saber disso. Lógica.

Claro que eu sei que as chances de alguém, que não abre um livro pra estudar faz uns anos (risos), passar na USP com uns meses de cursinho chegam a... NÃO EXISTIREM? Haha E eu não to criando expectativa nenhuma não, to indo com calma e se não der agora, vai dar no próximo ano. O que é um ano na nossa vida, né?

Como respaldo, posto esse comentário da Érika no post que eu escrevi no ano passado:
"Eu não posso garantir que você vai trabalhar com Jornalismo, que vai ser bem sucedido e feliz em Letras, que administração não é a sua. Só quem pode dizer qual é a sua é você mesmo (vim de uma discussão sobre "escolhas" e a palavra tá piscando no meu cérebro aqui).

Mas você não tem nada a perder (só o dinheiro da inscrição etc), então por que não? Sei lá, não te vejo discutindo Baudelaire, Shakespeare ou Guimarães Rosa, mas vejo você escrevendo. Porque você TEM um estilo seu, isso é um bom passo já. E é uma das coisas que mais ME preocupa, porque oi, gosto de escrever, de literatura, mas acho que sou "certinha" demais com gramática e acabo sufocando minha criatividade e personalidade com isso. Você não, você é muito autêntico. E autenticidade conta muito nesse mundo.

Dou a maior força e torço pra que você descubra que isso era tudo o que você sonhava na vida :)”
E é isso.
Boa sorte pra mim, que voltei a ter 16 anos.

sexta-feira, 8 de junho de 2012

d

Hoje achei que te vi.

Lembrei daquela noite, onde o tudo e o nada aconteceram ao mesmo tempo. Não consigo lembrar como de fato começou, onde foi que senti a fagulha pinicando a pele, vejo alguns borrões, alguns brindes de Chopp, uma amiga em comum e uma ex-namorada. Vejo seus olhos e seu sorriso torto. Gosto de pensar na sua mão, quando ela roubou a minha de cima do balcão e numa carícia singela espantou o mundo ao nosso redor pra longe.

Como numa Blueberry Night, estávamos no balcão de um bar qualquer, de costas para a rua, expostos numa vitrine, escondidos por algum adesivo mal colocado contra o vidro. Caminhamos até outro bar qualquer, quase escondido, quase sem luz, quase sem gente, quase sem vida. Cervejas e confidências. Quando sua mão reencontrou a minha, falamos de amores passados, falamos de dor, de mágoa, da vida. Do amor em comum, mesmo que de forma diferente. Das formas de amor, da forma de amar. Dor.

Gostaria de ser um terceiro naquele bar. Algum boêmio perdido no canto. Talvez o garçom que quase derrubei quando fui ao banheiro. Queria assistir o que vivi, para ter certeza de que aquilo estava acontecendo. Se foi real ou algum fruto doentio da minha alma cansada. Mas ao mesmo tempo queria apagar nossas fotos. Fotos que me perseguem, insistem em trazer memórias irreais, sonhos defeituosos, suspiros pela metade.
Incansáveis beats, ainda fomos badalar. Num lugar que certamente você não gostava, eu sabia. Eu sei. Mas ainda assim você foi, disse que só queria sair e estar comigo. Dançamos no tumulto. No balcão, buscando mais álcool, nos esprememos entre as pessoas. Você na frente, eu te segurando pela mão.
Ao pedir, mesmo de costas, me puxou para mais perto. Seu cheiro. Descontrolado, num abraço pela cintura, te apertei e encostei meu rosto nas suas costas. Você virou e por um instante meu mundo parou de girar. Perdido nos seus olhos e no seu sorriso ainda torto. Mal percebi o barman puxando minha comanda, nos obrigando a trocar de lugar. Tequila e cerveja.

Ah, tequila. Encorajando as pessoas a fazerem coisas estúpidas. Seu rosto veio de encontro ao meu, porém seus lábios encontraram meu rosto. Seu corpo sim, encontrou meu corpo, entre pedidos e bebidas, você me beijou levemente o rosto, passando levemente seu rosto no meu e beijando delicadamente meu pescoço.
Na tentativa de te beijar, encontrei hesitação. Com o rosto afastado, me puxou pelo braço, precisando de um cigarro. Você não fumava e eu não havia fumado a noite toda. Por você. Saímos e compramos um desses cigarros com sabor de cereja e acendi o meu e o seu enquanto atravessávamos a rua.
Cigarro. Meu terapeuta. A sensação de que eu havia feito algo errado não demorou a aparecer. A gente até então era amigo, né? Quer dizer, não, a gente não era amigo. Talvez colegas, se bem que não, não éramos nada. A gente só se conhecia. Naquela noite, acima de todas, éramos dois estranhos. Pedi desculpas pela tentativa de beijo roubado. Com suas duas mãos no meu rosto, perguntava insistentemente se você estava indo a algum lugar, que estava tudo bem. Eu gostaria que você tivesse de fato ido. Fugido. Estar lá de cara lavada e ainda me beijando o pescoço, só me deixou mais confuso e machucado.

Mas você sempre foi doce. Não deixaria de ser naquela hora. Abraços, desculpas, beijos no pescoço, um coração despedaçado e uma mente confusa. Sentamos no chão e você pediu que eu deitasse no seu colo. Deitei sobre suas coxas ainda te olhando, meio encolhido, sentindo o ar gelado da madrugada. Você foi se inclinando até que alcançasse meus joelhos e também se deitou sobre minhas pernas. E ali ficamos. Neste estranho círculo de carinho. A posição mais confortável da minha vida, que até hoje não consigo repetir, pela dor do lembrar.

Subimos a rua abraçados e abraçados nos despedimos. Pra sempre.

sábado, 10 de março de 2012

Textos que nunca terminei #1


Carolina

Ela era linda. E sabia disso. Nua, sambava em seu quarto, no décimo segundo andar do prédio onde morava há oito anos, com seus tios. Um quarto bonito, com uma cama de casal, quem via, imaginava que algum hippie passou por ali e deixou suas marcas. Muitas flores, muita cor. Numa das paredes, o símbolo de paz e amor pintado. Entre os vãos do símbolo, recortes de fotos de Carolina. Toda sua considerada vida explícita naquela parede, que ninguém nunca havia visto.
Uma correntinha de prata caída ao pescoço, com a chave do seu refúgio sempre pendurada. Colocou a parte de cima de um biquíni verde neon, amarrou-o no pescoço e se admirou no espelho que cobria metade da segunda parede de seu quarto. Na terceira parede, um guarda-roupas gigante estava com as portas abertas. Pegou a parte de baixo de um biquíni branco, passou a mão pelos cabides, escolhendo quase por acaso o que usaria. Um vestidinho branco, que mais parecia uma camiseta regata, deixava o verde da roupa de baixo transparecer. E um short jeans minúsculo, gasto nas barras e com o bolso rasgado. Uma sandália baixinha de couro marrom.
Um brinco grande, com uma pena preta pendurada raspando-lhe o ombro. O cabelo preso num coque que não deu certo. Semi preso, semi solto. Num misto de bagunça e perfeição. Afastou um pouco a cortina de sua janela. Sol. Pegou seus óculos que estavam em cima da escrivaninha, ao lado do seu notebook. Se admirou mais um pouco no espelho, enquanto passava um brilho labial.
Ajeitou as pulseiras que possuía, todas de pano, amarradas firme junto ao pulso. Colocou mais duas de miçangas e duas que ficavam frouxas e sempre deslizavam em seu braço quando ela mexia no cabelo. Ela gostava.
Celular no bolso rasgado, quase caindo. Dinheiro enrolado, apertadinho no bolso da frente do short. Foi até a tela do notebook, por MSN avisou ‘estou saindo’. Desligou a webcam e saiu do quarto, trancando a porta sem tirar a chave do pescoço, se abaixando. Como sempre fazia.
Passou pela cozinha e deu um beijo na tia.
-Não tenho horário.
-Ta na hora de criar juízo, menina.
Saiu sem responder, dando um tapinha na bunda da tia e sorrindo. Pegou o elevador sozinha e se namorou mais um pouco no espelho. Passando a mão pelo corpo, vendo se tudo estava no lugar. Ela sabia que o vigia estava assistindo pela câmera de segurança. Ele iria fingir que estava lendo o jornal quando ela saísse do elevador. Mas voltaria a gravação da câmera, como ele sempre fazia.
Ela saiu pelo hall de entrada e passou pelo porteiro do prédio, que lia o jornal do bairro. A porta bateu à suas costas. Esperou dois segundos e deu um passo pra trás, bem a tempo de vê-lo curvado, olhando de perto a imagem da pequena tela de segurança.
‘Todos iguais’ – ela pensou. E, agora sim, foi.

sexta-feira, 6 de janeiro de 2012

quinta-feira, 5 de janeiro de 2012

Um Sonho.(?)


Matusaelizando



Poderia ter sido a lente queimando seus olhos, a luz do sol que começava a entrar pela fresta da cortina da sala, ou algum ronco que vinha de outra pessoa que ali dormia. Tudo junto. Outros diriam que foi um alien, o espírito da noiva ou um galo zumbi. Tiago acordou virado para o forro de madeira no teto, visualizando manchas brancas, que desenhavam o contorno de seus amigos espalhados pelo chão.

Lembrou-se da noite anterior, quando só conseguia enxergar o vaga-lume que ficou trancado para dentro. Ele piscava e Tiago gritava exaltado. Chegou a lembrar alguma piada interna, sobre coisas que piscam. Pôde ouvir as risadas de Érika e Thalita vindas da outra sala. Era tão bom ouvi-las sabendo que elas estavam logo ali.

Sentou-se na cama, tomando coragem para começar mais um dia. Aliás, mais um ano. O primeiro dia do ano. Olhou para o lado e viu Marcos descabelado, numa posição que muitos ali nem acordados e alongados conseguiriam reproduzir. O braço para fora da coberta, metade caído no chão, tocando de leve o aparelho celular com as pontas dos dedos. Nem dormindo ele desgrudava do aparelho. Tiago sorriu, lembrando de Marcos tomando sol com o celular na orelha. Vislumbrou Marcos com uma marca branca no rosto no formato do celular. Riu em voz alta. Ninguém sequer notou.

Café. Ele precisava de café. Num outro colchão aos seus pés, Matusael dormia com um sorriso no rosto, provavelmente sonhando com algum webhit maravilhoso, montando piadas para usar durante o dia. Na beirada do seu colchão havia uma latinha de cerveja, provavelmente cheia e quente.

Com medo de derrubar a cerveja, tentou sair pelo outro lado, passando por cima do Marcos, e quase pisou um pequeno casulo que havia se formado com o edredom. Era Camila. Ela dormia como se nunca houvesse dormido na vida. Respirava profundamente, como se precisasse de ar, como se minutos atrás tivesse quase se afogado. Mas talvez fosse só o calor do edredom.

Passou por Victor, Guilherme, Gabriel e Cauê, desviando dos colchões. Onde estava Thali?, pensou. Na cozinha, garrafas vazias de conhaque, groselha e tequila. No balcão, tomado por celulares e óculos de sol, uma maça toda mordida. Cinzas do narguile espalhadas por todo lugar. CIGARRO. Tiago precisava de cigarro. E café. Começou a abrir os armários, procurando algo para ferver a água. Releu o recado na geladeira, informando que o show havia sido cancelado. Quase teve um ataque.

Após pegar uma chaleira, foi para a cozinha de fora, onde ficava o único fogão que funcionava. Na pia, resquícios de uma panelada de brigadeiro deliciosa, um molho branco que surgiu devido ao milagre da multiplicação, um leve cheiro de arroz queimado, uma salsicha abandonada e uns potes vazios. Perguntou-se onde estava a carne - apesar de fora da geladeira, ela deveria estar ali. Talvez estivesse em outro lugar.

Voltou à casa, para buscar o isqueiro. Vazio. Eles usaram para acender o carvão do narguile na noite anterior. Foi procurar outro isqueiro, daqueles de padaria, na cor laranja, que a Paula havia pegado emprestado com o caseiro. Talvez estivesse no quarto. Passando pelo corredor, viu a pia caída no chão. E um cheiro de queimado – ou merda – no ar. Tentou puxar pela memória o que havia acontecido, mas o cheiro estava mais forte do que a vontade de lembrar e continuou caminhando.

Thali estava num dos quartos, encolhidinha numa das camas, dormia virada pra janela, com o sol já batendo em seu rosto. Estava serena, talvez até triste. Nostálgica? Essa época do ano mexe com nossas emoções. Tiago quis abraçá-la e dizer que estava tudo bem. Mas resolveu não acordá-la. Deixá-la descansar era a decisão mais sábia para que depois eles pudessem pirar durante o dia e rir até o mundo acabar.

Passou pela sala novamente, vendo Paula entre Arthur e Bruno. Um sanduíche que invejaria qualquer pessoa. Torceu para alguém estar acordado, para que ele pudesse fazer alguma piada ou repetir que aquilo esticado não era o joelho dos meninos. Mas ainda dormiam. Na mesa da outra sala, encontrou o isqueiro e um maço do cigarro mentolado, que ele achou que havia acabado. Estava embaixo de um iPod preto. Resolveu ver qual a última música havia sido tocada, mas o aparelho estava bloqueado. Mais fácil seria chocar um ovo de dragão com sucesso do que descobrir aquela senha. Havia outro iPod no deck, a música pausada era Make me Feel, do Cobra Starship.

Acendeu a boca do fogão, ferveu a água, preparou o café e voltou para a varandinha, na frente da casa. Sentou-se no chão, entre alguns pedaços de frango avermelhados. Tomou seu café e fumou o cigarro mais delicioso da sua vida. Ele tinha tudo o que precisava ali, entre as árvores daquele lugar. Tirou o celular do bolso para verificar as horas e, no reflexo da tela, viu como seu olho estava inchado. Ele chorou na noite passada. Sentiu-se bobo.

Lembrou-se de ter ido até o meio do gramado, seguindo um vaga-lume e tentando se aproximar. Virando-se para a casa, viu as pessoas ao redor da mesa. Mesmo Alana, que era a mais nova integrante do grupo, já estava entrelaçada em todos. Tiago tinha medo que o grupo desapontasse Bruno e ela, que antes nunca tinham passado tanto tempo junto assim com todos eles. Mas não, mais uma vez estava provado que alguma coisa ali era maior, maior do que as diferenças entre eles. O que tinham em comum era mais forte.

Guilherme tinha acabado de deixar o violão de lado e ia em direção à mesa. E, entre tantos que Tiago gostaria que estivessem ali celebrando, lembrou-se de Luciane. Divagou sobre o futuro, imaginando ela com Guilherme, de mãos dadas, esperando em fila para se servir de algum prato especial de ano novo que Arthur tivesse feito com todo amor e carinho do mundo para todos.

Érika ria, sentada na ponta da mesa, como todo bom chefe de família faz. Da nossa família de escândalos e luxúria. Ela apontava para Victor, que rodopiava pela sala, emulando as lindas luzes de uma aurora polar e quase derrubando Bruno, que vinha com uma taça de champagne na mão. Que caiu, obviamente, quando Gabriel chegou fazendo um bate cabeça com os dois. Todos riram e Érika comentou algo com alguém que estava ao seu lado. E de repente, Tiago notou que todos ali estavam acompanhados. A mesa na verdade havia dobrado de tamanho, o sítio também. Sequer era o mesmo sítio.

Ao olhar para trás, Cauê vinha de outro canto das árvores, seguido por algumas crianças, e em cada uma Tiago via os traços de seus amigos: fosse um cabelo loirinho, um sotaque mineiro, os olhos claros característicos, os olhos escuros, a alegria de viver, a bondade, ou a acidez. Todos com lanternas nas mãos, explorando a noite. Paula vinha ao fundo, de mãos dadas com alguma criança que visivelmente estava morrendo de medo, mas que estava encantada com a canção que Paula tentava ensinar as crianças. Cauê reforçava que a rua não era dos gordos e Paula se desmanchava.

Tiago era a terceira pessoa naquela visão. Um voyeur. Tudo estava intacto, minimamente planejado, todos vestiam branco, riam expansivamente. Breno esbravejava com Arthur alguma coisa sem o menor sentido, enquanto Tiago abraçava Alana na cozinha para provocá-lo. Todos estavam tão diferentes e tão iguais. Eram os mesmos na personalidade, mas com uma alegria diferente... Potencializada. Estavam realizados.

Perdido em emoções, sentiu Paula abraçando-o e logo todos estavam a sua volta, pulando e comemorando. Acordou do transe. Com lágrimas nos olhos e um nó na garganta, voltou para dentro, deu uma olhada para cada um e perguntou-se se aquele ano-novo seria repetido outras vezes. Em seu monólogo mental, concluiu que sim, não foi só uma alucinação.

E lembrou-se do sorriso que deu, olhando para seu prato na mesa, imaginando as possibilidades infinitas de felicidade que aguardavam cada um daquele grupo. Viu novamente em um flash a família crescendo, com pessoas que não se importam se você é gordo, magro, gay, branco, preto, amarelo, indie, metaleiro, pagodeiro, espírita, evangélico, católico, vegetariano, se só toma suco de maracujá, se só toma no cu, se quebra pias, se larga a cerveja no banheiro, se joga casca de banana no chão, se te bate na cara, se vomita no seu pé ou se te acordam delicadamente rolando por cima de você.

E o cigarro já queimava a ponta dos seus dedos. Abriu a porta da sala, colocou Glamurosa no último volume e rolou por cima daqueles corpos maravilhosos, não sabendo mais se divagava ou se estava acordado. Então começou a ouvir os gritos de dores de um Arthur muito bravo, com suas queimaduras de sol, sono e rinite. Enxotado por ele, Paula e Bruno, rolou por cima de todos e parou sobre Érika com um abraço e um beijo.

É tão bom estar em casa.